Sarau revoltirinhas – A literatura

A literatura é elitizada e está sendo difícil dizer isso assim, abertamente. Porque sempre pensei que o que me separava das grandes obras, da genialidade contemporânea da literatura brasileira era simplesmente minha falta de disposição de ir até uma biblioteca, de ir até uma livraria.
Até o dia em que fui até a biblioteca, e fui até a livraria. As pessoas simplesmente não conhecem, sabem por cima das coisas antigas “Machado de Assis” e outras coisas empoeiradas, mas nada de agora. Do agora sabem dos livros descartáveis, americanos, juvenis.
Você nem sabe como pesquisar, como se pesquisa isso? Tentei coisas do tipo “Oscar da literatura”, e de lá surgiram prêmios e autores, mas não tocava o ponto. Não tocava como Clarice Lispector tocava, entende?
Foi muito frustrante descobrir que a literatura está muito, muito distante dos reles mortais. Se de mim está, que sou da bunda na cadeira, da obsessão pelos estudos e sempre espiando alguma sugestão, imagina pra quem procura uma vida menos ansiosa, menos obcecada.
Parece que a literatura é pra gente que nasceu com a sorte dos círculos elevados, pra gente muito “cabeça”. Mas é só aparência, eu te garanto. Os grandes nomes fascinam a mim, a qualquer um. O que se tem não são pérolas guardada dos porcos, mas apenas pérolas mofando em círculos elitizados.
Vou contar pra você como descobri um par de nomes. Uma amiga minha, Bia. Muito escritora, muito sensível, muito arguta. Um dia me disse “você conhece Valter Hugo Mãe?” Disse que não. Ela me falou dele com uma admiração muito difícil de ver, daquele tipo legítimo, que você tem que correr pra buscar. Aquele sinal de coisa rara.
Depois que li alguns textos dele fiquei iluminado, entendi o que ela quis dizer. Mas também fiquei bem puto. Bem puto. Porque o que me separava de Valter por todos esses anos não era meu despreparo pra sua literatura, mas era a marginalização que essa coisa (não sei se chamo de sistema, de indústria cultural…) essa coisa me impôs.
Então, no tédio da quarentena, muitos meses depois do meu encontro com Valter Hugo Mãe, me deparei com um curso sobre escrita criativa, um curso que quase não assisti e lá ouvi um nome: Sérgio Sant’anna. Fui atrás pela maneira que a professora falou dele, tinha aquela pitada da fascinação de Bia.
E lá estava eu, na crônica chamada “O corpo” e mais uma vez me vi iluminado e revoltado. De novo passei anos sem Sérgio por perto. Ele escreve de um jeito fácil e forte e denso.
É engraçado porque as pessoas mais cotidianas que já conheci, essas pessoas adorariam essa literatura tanto quanto eu e talvez se sentissem tão putas como eu por passarem uma vida inteira longe de tanta coisa boa.
Eu só descobri dois nomes. Nem quero pensar como vou ficar quando descobrir um verdadeiro panteão contemporâneo que simplesmente me foi segregado. Tá sendo difícil dizer, mas a literatura é elitizada.

JL

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