7 de Setembro

cronica

Hoje, às 8h30 eu estava no meio da rua de uma cidade do interior, esperando pela primeira vez o início de um desfile cívico. Estava entre pais, familiares e professoras de criancinhas de três anos, que se amontoavam num pedaço demarcado se preparando para a marcha.
As crianças chegavam de mãos dadas com as mães, abraçavam as professoras com uma sincera saudade de quase um dia inteiro e ficavam distraídas com aquele mar de gente grande e aqueles “tios” que vendiam toda sorte de bugigangas coloridas.
Duas professoras os ajeitavam, colocando pequenas boinas azuis em suas cabeças. Depois passavam por entre eles com uma caixa desajeitada de papelão onde se empilhavam instrumentos musicais de brinquedo. Aqueles oito aluninhos iriam tocar numa pequena bandinha.
Cada um escolhia o seu entre 4 opções: Chocalho, tamborzinho, flauta doce e violãozinho de 4 cordas (a maior parte escolheu a flauta).
A julgar pela liberdade de escolha permitida, seria uma banda de improvisadores profissionais.
Todos ficaram apostos, iria começar em breve. Enquanto esperavam, as criancinhas sopravam suas flautinhas. O ar, que já estava repleto de bolhas de sabão, agora enchia-se de “fuuu-fuu-fuuu” criados em pequenos soprinhos curiosos e levemente entediados.
Lá na frente, há umas 4 turminhas de distância, a banda marcial de soldados do exército iniciou a música, a versão instrumental do hino da independência. O ritmo evocava na memória “ou ficar a pátria livre ou morrer pelo Brasil”. Porém estavam longe, lamentei por quase não ouvi-los de onde estava.
Até perceber que “fuu-fuu-fuu’s”, batidinhas de tambores e chacoalhadas de chocalho me cercavam. Aquelas crianças eram a verdadeira banda daquele desfile. A inocência e espontaneidade, os sorrisos sinceros, a “marcha” que virava logo uma caminhada de passinhos curtos. Ali estava a banda mais bonita de todo o desfile.
Os observava “Esses pequenos seres humanos estão cheios de potencial, são gênios ainda na semente. Cada um aqui pode mudar o mundo…” Eu sentia vivamente neles o potencial de superar o homem, de serem os super-homens de Nietzsche. Só precisavam de proteção e respeito. Fiquei pensando… “O que dá errado no caminho?”.
Nossa ala já passava pela banda marcial que tocava parada enquanto o desfile passava por ela. Os soldados tocavam “Atirei o pau no gato” seguido de “Superfantástico”. Aquilo me surpreendeu. Aqueles homens rudes, cinza e verdes, de coturnos negros, tocavam firmes uma homenagem aquelas criancinhas. Não uma homenagem “rude, cinza e verde”, mas uma homenagem terna à infância.
Naquele momento vislumbrei um mundo. Um mundo onde soldados são treinados para proteger a inocência das crianças. Um mundo onde a luta é pelo bem e é conquistada com honra e respeito.
Enfim o desfile das criancinhas terminou e sentei-me para assistir o restante dele numa padaria. Vinham logo depois as turmas mais velhas, gradativamente.
E gradativamente eu via o brilho ir sumindo dos rostos. A resposta a minha pergunta despretensiosa desfilava na minha frente naquele instante.
Jovens cansados da banalização de um ensino alienador, se preparando para virar instrumento inanimado de uma máquina incoerente. Pessoas sem viço, sem gana de serem melhores, por terem sofrido o desensino, pelo mesmo Estado que as acolheu.
Aquela gente sem viço, eram as outrora criancinhas que acompanhei lado a lado.
JL